+ Dom Jaime Spengler
Arcebipos da Arquidiocese de porto Alegre
Várias situações do momento presente nos levam a perguntar: o que fazer? Esta questão encontra eco na constatação do Papa Francisco, no dia 27 de março, diante de uma Praça de São Pedro vazia, num final de tarde: “Desde há semanas que parece o entardecer, parece cair a noite. Densas trevas cobriram as nossas praças, ruas e cidades; apoderaram-se das nossas vidas, enchendo tudo dum silêncio ensurdecedor e de um vazio desolador, que paralisa tudo à sua passagem: pressente-se no ar, nota-se nos gestos, dizem-no os olhares. Revemo-nos temerosos e perdidos”. Uma mutação de um vírus está impondo a modificação do estilo de vida: trabalho, saúde, educação, economia, prática religiosa. Está rasgando o véu da desigualdade social, da injusta distribuição da renda que está se transformando em uma “bomba-relógio de raiva e desconfiança”, da falta de cuidado para com a Casa Comum. Há quem apregoa a necessidade de redesenhar o sistema econômico tradicional. O lucro a todo custo certamente não poderá mais ser admitido e permitido. A pandemia mostra que o Estado não estava preparado - e não está! -, para proteger seus cidadãos de um vírus. A tecnologia avançou a passos largos. Contudo suas conquistas e avanços não estão conseguindo vencer esse vírus, que ameaça a todos indistintamente. O que fazer? Um futuro melhor só será possível se construído na dinâmica de um presente. Isto requer disposição para superar a insolência dos oportunistas de plantão. Sob a aparência de juras de amor pelo ser humano, observa-se o desprezo pelo ser humano. “O desprezador despótico dos seres humanos (...), aproveita o que a de mais ordinário no coração humano, alimentando-o e dando-lhe outros nomes: medo passa a ser responsabilidade; ganância chama-se aplicação; dependência transforma-se em solidariedade; brutalidade em senhoralidade. (...) Para ele a popularidade vale como prova do maior amor aos seres humanos; ele esconde sua profunda e secreta desconfiança contra todos os seres humanos atrás de palavras roubadas de verdadeira comunhão” (D. Bonhoeffer). Nestes tempos que parecem o entardecer e o cair da noite, impõe-se a pergunta: O que fazer? Esta foi também a pergunta dos discípulos de Jesus no momento da crise: “A quem iremos Senhor? Só tu tens palavras de Vida eterna” (Jo 6,68)!
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